A função inferior
Por: Hellen Reis Mourão
A função
inferior é nosso calcanhar de Aquiles, onde está a nossa ferida mortal, aquilo
que não gostamos de ver em nós. Onde “pagamos mico”, nos embaraçamos.
Aquilo que te
fere, que te toca, que te da vontade de gritar, chorar...Sua ferida mortal!
Sendo a porta do
inconsciente quando cutucada se abre para a sombra, ativa complexos e detona o
ego.
É como pisar em
formigueiro, em questão de segundos seu pé está lotado de formigas. As formigas
são complexos que “engolem” o ego.
Muitos me
perguntam como assimilar a função inconsciente¿
Eu respondo: é
impossível!
Essa é uma idéia
ilusória do ego, que podemos ”assimilar” a função inferior. Pois ela é o
inconsciente. Ela é o portal por onde passam os nossos conteúdos sombrios. E é
humanamente impossível assimilar todo o inconsciente. Cada vez que você se
conscientiza de um conteúdo sombrio, logo vem outro.
Somos
completamente incapazes de exercer um controle consciente da função inferior,
somos o tempo todo arrastados por ela e incapazes de pôr um freio, e pará-la.
O ego é uma parte
ínfima do sistema psíquico, mas é extremamente arrogante. Na verdade é o ego
quem deve se render a ela, pois ela é maior que ele.
Existe uma
variedade de testes para “detectar” o nosso tipo psicológico. Todos que começam
a estudar Jung ficam fascinados e curiosos para se identificar com um tipo. E
quando descobrem se sentem importantes por serem intuitivos, ou pensadores
lógicos. E o ego acaba inflando mais e a atitude consciente fica mais
unilateral.
Eu confesso que
já cai também nessa tentação. O ego pode ser incomodo insolente!
Mas o que é
importante lembrar é que a função inferior é muito maior que a superior. O ego
é apenas uma pequenina ilha vagando em meio a um oceano que é o inconsciente.
Somos uma partícula ínfima!
O ego não quer
sofrer, se identifica com uma função como forma de defesa. Mas essa defesa
quando perdura se torna neurose.
Render-se pode
causar vergonha, mas devemos nos eliminar a identificação com uma função e aprender
a navegar em outros mares. Começando devagar com as auxiliares, que já
ampliarão a percepção do mundo e de si mesmo.
Sem a função
inferior todo o processo da vida e de desenvolvimento psíquico iria se
petrificar e estagnar em uma atitude unilateral da consciência.
Von Franz, em A
Função Inferior compara as quatro funções com quatro portas, sendo que a quarta
e inferior nós não possuímos a chave. Essa porta nunca será fechada, pois é
nela que devemos sucumbir, sermos derrotados afim de que possamos nos
desenvolver.
Através dela as
figuras como sombra e anima/animus podem passar. E é comum que essas instâncias
psíquicas estejam contaminadas pela nossa função inferior. Assim um intuitivo,
por exemplo, pode se apaixonar por uma mulher tipo sensação, projetando a sua
anima e função inferior nela.
Nossa função
inferior pode nos aparecer em sonhos com um aspecto animal, pois ela é
primitiva. Sendo primitiva fazemos um esforço descomunal para não expormos
nosso lado animal e nossa inferioridade aos outros. E nessa hora usamos o nosso
controle habitual, valendo-se de uma persona bem desenvolvida.
Mas esse lado
animal da função inferior nos liga aos nossos instintos mais profundos, perdidos,
aos antepassados e a toda história da humanidade.
Outro ponto
importante a ser mencionado e que causa muita confusão, é o que diz respeito a
assimilação. Como disse, assimilação da função inferior é impossível, primeiro
porque se assimilarmos ela toda, fechamos a porta do inconsciente. Segundo, que
assimilação de uma função é algo muito profundo.
Como diz Von
Franz, em A função inferior:
“Assimilar uma
função significa viver com ela no primeiro plano. O fato de alguém cozinhar ou
costurar um pouco não significa que a função sensação foi assimilada. A
assimilação significa que toda a adaptação da vida consciente recai naquela função
por algum tempo. A passagem para uma função auxiliar ocorre quando se sente que
a atual maneira de viver se tornou “sem vida”, quando se fica, de modo mais ou
menos constante, entediado consigo mesmo e com as próprias atividades.”
Concluindo, ser
tocado pela função inferior, traz a sensação de colapso interior, de um
sentimento de impotência.
Ela vai
acontecer quando o domínio da consciência e a atual situação de vida do
individuo se tornou obsoleta e “sem sentido”. Seu modo de vida é sem vida, sem
libido, sem Eros. Ela vem para vencer a tirania da função dominante, que aprisiona
o ego.
Entretanto, ela
irá trazer as camadas mais profundas do inconsciente até nós. Devemos nos
comprometer com ela. Ela pede um compromisso, e não apenas visitas esporádicas.
Somente assim, ela poderá promover mudanças em toda a estrutura da
personalidade.

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