O Animus e o pai

 

Por: Hellen Reis Mourão

Um dos aspectos do Animus está associado a figura paterna. A experiência que a mulher tem com o pai pessoal, e mais ainda, com o pai arquetípico, são de extrema importância para a compreensão de um dos diversos aspectos do masculino interior dela. O pai pessoal é o primeiro homem a receber a projeção desse masculino interior, e é um pouco sobre esse aspecto que quero falar, mediante a percepção que venho tendo ao longo do tempo. Simbolicamente o pai representa a lei, a ponte para o mundo, o objeto, o trabalho, a ordem.

No caso da mulher, uma relação com o pai positiva, pode lhe proporcionar autoconfiança feminina. Como diz Von Franz em O Caminho dos sonhos:” A menina percebe que seu pai chega em casa cansado e ela lhe dá um sorriso charmoso; ele a deixa fazer tudo o que a mãe proibiu durante o dia. E assim ela logo descobre seu poder enquanto mulher. Ora, um pouquinho disso é muito bom, porque lhe proporciona autoconfiança feminina. Ela descobre que, enquanto mulher, é alguém — já que consegue até mesmo que papai se ponha a seus pés.”

No caso de um pai ausente, ou fraco, tirano, ou que não deu atenção a essa filha, ela pode desenvolver uma baixa estima profunda em relação a ser mulher, e seu poder de sedução. Pode se submeter a relacionamentos abusivos, apenas para chamar a atenção do “papai”, que ela não teve na infância. Ou no caso da ausência, seja por morte ou abandono, ela pode abandonar antes de ser supostamente abandonada.

No entanto, o complexo paterno, devido a uma relação muito próxima a ela, ou até por meio de uma idealização dele, pode transformar a mulher em uma imitação da Anima do pai.

Von Franz, comenta sobre isso, em O Caminho dos sonhos:

“(...)se uma mulher tem essa tendência a representar a anima para o pai, ela assume um papel divino, visto que animus e anima são mitológicos, pertencem ao mundo dos sonhos e não à realidade exterior. Portanto, uma filha que flerta demais com o pai, entrando numa relação incestuosa íntima demais com ele em geral adquire uma inflação secreta. Ela se eleva à dignidade de uma rainha e espera que os homens estejam a seus pés, exatamente como forçou seu pai a fazer. Gradualmente, ela desenvolve uma certa arrogância e sente que é especial. Torna-se inatingível para homens comuns e os que tentam chegar perto sentem que ela é uma princesa e não alguém que se pode tranquilamente levar para a cama para se ter um sadio relacionamento animal.”

Além disso, o simbolismo do pai, remete a ser uma ponte para o mundo. Onde, em um lado ideal, ele é aquele que apoia o filho para assumir riscos.

Vamos pegar uma imagem comum que compartilhamos sobre o pai. Geralmente quando vemos imagens de pais com seus filhos, eles estão jogando o filho para cima, ensinando a andar de bicicleta, etc. Ou seja, ele é o chamado para a aventura, e a posterior segurança em assumir os riscos.

Idealmente o pai é o chamado e o fortalecimento para o desconhecido, e ele dá essa base para que o masculino interno da mulher se fortaleça, de forma a ela se bancar em suas aventuras e a correr riscos.

Quantas mulheres dizem a si mesma que só vão viajar se estiverem com alguém, ou ter uma casa própria se forem casadas. Só vão estudar se os filhos crescerem, não se separam por causa dos filhos, etc.

Um pai ausente, ou fraco, impede que esse Animus se desenvolva, de forma a mulher fazer seus movimentos com segurança. Por isso, um dos pontos importantes para a mulher, é o desenvolvimento desse pai interno.

Cabe a reflexão: Qual foi o chamado do seu masculino para a aventura, ou desafio, que foi negado por medo?

Esse masculino não se refere, necessariamente, a um homem de carne e osso, mas a algo que te tira da zona de conforto. Pode ser um projeto, uma viagem, uma nova formação acadêmica, uma ideia.

Trata-se do impulso para a vida! Para romper alguma barreira. E como o pai se refere ao objeto, ao objetivo, geralmente são impulsos que vem do outro, seja alguma pessoa, alguma instituição, etc.

Quantas vezes esses impulsos foram negados?

Sem isso, a mulher teme o fracasso e não se arrisca a errar e falhar, e até eventualmente quebrar a cara.

Esse aspecto do masculino, da força do pai, faz com que a mulher não tema a experiencia negativa, mas que compreenda que até no fracasso ela ganha, porque ela sabe tirar uma lição das experiências.

Uma experiência com um pai opressivo, tirano, pode fazer com que a mulher sinta culpa por errar. E é nesse momento, que a força positiva do pai interno precisa ser acessada, no sentido de se permitir falhar e recomeçar.

Outra experiencia comum, e que pode ser nociva ao desenvolvimento do Animus da mulher, é quando a mãe fala mal do pai, e coloca os filhos contra ele.

Quando isso ocorre, a tendência é da filha se identificar com a dor da mãe, e a querer salvá-la. Nesse caso, a filha orbita ao redor da mãe, como uma Coré – Perséfone, e seu Animus, fica a serviço da mãe, e não ao desenvolvimento de sua psique.

Nesse caso, ir em busca de seus desejos e chamados externos significa uma traição a mãe. A filha vai precisar descer aos infernos da culpa, e se despedir das dores que não são delas, mas da mãe.

 


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Iansã e o domar das emoções

O amor nos contos de fadas

Carl Jung e PNL: A congruência no processo de individuação