Oxum – A Afrodite afro-brasileira
Por: Hellen Reis Mourão
Pouco se tem
escrito, em termos psicológicos, sobre os mitos africanos. Uma pena, já que
esses mitos permeiam uma religião tipicamente brasileira, a Umbanda e vieram a
fazer parte da nossa cultura via os escravos.
Um trabalho
relevante, na área da psicologia analítica, é o do prof. José Zacharias, com
seu livro A Dimensão Arquetípica dos Orixás.
A Mitologia
Yorubá é composta pelos Orixás, que são deuses da natureza e que representam
arquétipos já conhecidos nossos, mas com uma roupagem diferente.
O primeiro Orixá
que vou descrever é Oxum, a senhora do Amor africana.
Oxum é a Deusa
das águas doces e frescas, divindade do rio Oxum, na Nigéria.
É o orixá do
ouro, do mel, da beleza, do amor e da gestação.
Exú é o orixá
responsável pela fecundação. Quando ocorre a fecundação, a regência passa a
Oxum, que protege o feto durante esse processo. Após o nascimento a regência
passa a Iemanjá.
A ela pertence o
ventre da mulher (lembrando que o feto se desenvolve dentro de uma bolsa d’água).
Regente também da menstruação, da gravidez e do parto. E desempenhando, assim
importante função nos ritos de iniciação, que são a gestação e o nascimento.
As mulheres que
desejam ter filhos costumam se dirigir a ela.
Uma lenda
interessante sobre ela é:
“Quando todos os
orixás chegaram a terra, organizaram reuniões onde as mulheres não eram
admitidas. Oxum ficou aborrecida por ser posta de lado e não poder participar
de todas as deliberações. Para se vingar, tornou as mulheres estéreis e impediu
que as atividades desenvolvidas pelos deuses chegassem a resultados favoráveis.
Desesperados, os orixás dirigiram-se a Olodumaré e explicaram-lhe que as coisas
iam mal sobre a terra, apesar das decisões que tomavam em suas assembléias.
Olodumaré perguntou se Oxum participava das reuniões e os orixás responderam
que não. Olodumaré explicou-lhes então que, sem a presença de Oxum e do seu
poder sobre a fecundidade, nenhum de seus empreendimentos poderia dar certo. De
volta a terra, os orixás convidaram Oxum para participar de seus trabalhos, o
que ela acabou por aceitar depois de muito lhe rogarem. Em seguida, as mulheres
tornaram-se fecundas e todos os projetos obtiveram felizes resultados” .
Sendo a senhora
do ouro, é uma deusa da riqueza, da fartura.
Oxum domina os
rios e as cachoeiras, mostrando que atrás de uma superfície aparentemente calma
podem existir fortes correntes e cavernas profundas.
As lendas
costumam representá-la com ricas vestes, perfumes e com colares e jóias, ou
seja, tudo relacionado à vaidade. Ela é também representada com uma
feminilidade elegante e coquete.
Antigamente,
Oxum era associada ao cobre, pois esse era o metal mais valioso do país ioruba
nos tempos mais antigos. Depois sua associação passou ao ouro. Mas o que
importa é que ela rege os metais preciosos.
No Brasil, o dia
da semana consagrado a ela é o sábado e sua saudação é como na África, feita
pela expressão “Ore Yèyé o!!!” (“Chamemos a benevolência da Mãe !!!”).
Conforme Pierre
Verger, em seu livro Orixás:
“A sua dança lembra
o comportamento de uma mulher vaidosa e sedutora que vai ao rio se banhar,
enfeita-se com colares, agita os braços para fazer tilintar seus braceletes,
abana-se graciosamente e contempla-se com satisfação num espelho.”
Oxum também é
ligada aos feitiços, devido a sua ligação com a Iá Mi Oxoronga, feiticeira
poderosíssima e também roubou de Orumilá os segredos da leitura dos búzios, os
quais qual divide com Exú. Portanto, a intuição, os encantamentos são partes de
sua faceta, tanto que, a maioria das mães de santo são filhas de Oxum.
Mas Oxum também
tem seu lado sombrio. E esse lado se manifesta em sua vaidade extrema, levando
a competição desenfreada com outras. Em uma de suas lendas, Oxum matou Iansã,
devido à inveja de sua beleza.
Outra lenda
muito famosa de Oxum e que mostra sua sombra é aquela em que ela manipula Obá,
levando-a a cortar sua própria orelha e servir no jantar para Xangô.
Oxum também podia
ser vingativa, competitiva e dissimulada.
Pode-se afirmar,
então que Oxum representa um arquétipo predominantemente feminino. Ela remete
aos mistérios da feminilidade. É o símbolo do poder feminino da fecundação e da
continuidade da vida.
Sem esse
arquétipo, é impossível, como descrito no mito acima, levar a cabo qualquer
empreendimento. Sem ele não há fertilidade, não há prosperidade. Pois não há
gestação.
Oxum é, então, a
“mãe das mães”. Nos arcanos maiores do Tarot encontramos esse arquétipo no
trunfo número 3, A Imperatriz. Que simboliza criatividade, sucesso, gestação,
encanto, amabilidade e cortesia.
Outro paralelo,
enquanto deusa da fertilidade e da maternidade, pode ser feito com Demeter, a
deusa grega da fecundidade da terra.
Sua
sensualidade, intuição, demonstra toda sabedoria feminina, toda manifestação
criativa.
A ela pertencem
todas as manifestações criativas, sensuais e alegres. A dança, a música, toda
forma de arte, a culinária e também a cura.
Como deusa do
amor, tem paralelos com Afrodite, Vênus, Ishtar, Astarte. Sendo também uma
deusa alquímica, transformadora (ver post sobre Afrodite).
Como senhora do
ouro, simboliza o que é incorruptível. Os nossos valores, não apenas materiais,
mas valores espirituais também.
Quando esse
arquétipo se torna presente na vida do individuo, seja homem ou mulher, traz
criatividade, imaginação fecunda, alegria de viver e desfrutar os prazeres da
vida. Proporciona também graça, leveza, amabilidade, diplomacia e paciência
para com os dissabores da vida, trazendo a doçura do mel e frescor de suas
águas.
ZACHARIAS,
J. J. M. Zacharias. Oriaxé – A dimensão arquetípica dos Orixás. São Paulo: Vetor,
1998.
VERGER,
P. F. Orixás. Círculo do Livro.
LIMA,
L. F. de. Oxum. Coleção Orixás. Rio de Janeiro: Pallas, 2008.
BARCELLOS,
M. C. Os orixás e a personalidade humana. de Janeiro: Pallas, 2010.
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