Frozen
Por: Hellen Reis Mourão
Nesse fim de ano
resolvi escrever sobre o conto de fadas moderno que tem mexido com a psique das
meninas (e dos adultos também) em todo mundo: Frozen.
O filme é
levemente baseado no conto de fadas A Rainha da Neve, o qual já analisei aqui
no Blog, e relata a história de duas irmãs filhas do rei de Arendele: Elza e
Anna.
As duas possuem
personalidades diferentes. Anna é alegre, extrovertida e busca encontrar o amor
de sua vida; Elza é comedida, introvertida e quer aprender a lidar com seus
medos.
As duas irmãs do
filme apresentam atitudes bem marcantes e opostas que exemplificam claramente
aquilo que Carl Jung denominou de introversão e extroversão.
Conforme Carl
Jung (1991), extroversão e introversão mostram tipos gerais de atitudes, e elas
se distinguem pela direção de interesse e movimento da libido, ou seja, da
energia psíquica. Em outras palavras, a atitude da consciência será determinada
pela direção de interesse em relação ao objeto.
Por objeto,
entendemos tudo aquilo que não é o sujeito e que não se liga a pessoa e seu
mundo interior, seus desejos e seus medos, incluindo pessoas e estímulos
externos.
Os introvertidos
são aqueles que hesitam, recuam e enxergam o contato com o objeto com receio e
como se fosse algo pesado, massacrante. O mundo externo os desgasta e isso faz
com que ajam de forma a atribuir ao objeto um superpoder.
Já os
extrovertidos partem rápido e de forma confiante ao encontro do objeto.
Aparentemente o objeto tem para ele uma importância enorme, mas no fundo o
objeto não tem tanto valor assim e por isso é necessário aumentar a sua
importância.
Resumindo,
conforme Silveira (1981) na extroversão a libido fui sem embaraços ao encontro
do objeto. Na introversão a libido recua diante do objeto, pois este parece ter
sempre em si algo de ameaçador que afeta intensamente o individuo.
Anna é
extrovertida, jovial, se intromete em tudo e vive em busca relacionamentos,
principalmente com sua irmã a introvertida Elza para qual o mundo externo é
assustador. Sua personalidade é mais grave e desconfiada que a de Anna. Seus
medos a assolam levando-a a reclusão. Ela busca se precaver de qualquer
dispêndio de energia e acredita que o mundo externo enxerga seus dons como
malignos.
Esse filme
também vem ilustrar bem o que Jung diz sobre o fato das atitudes em relação ao
objeto serem funções de adaptação. Cada uma das irmãs se adaptou ao meio em que
vivia forma particular e individual.
Além disso, o
fato das duas virem da mesma família mostra que as atitudes em relação ao
objeto não são escolhas conscientes, mas inconscientes e instintivas.
Elza possui um
dom especial – o de congelar tudo a sua volta. Apesar de ser poderosa, ela não possui
controle sobre seus poderes o que a torna perigosa para quem convive com ela,
principalmente para sua irmã Anna.
Mediante esse
fato os pais da menina decidem isolá-la do mundo.
Os pais de Elza
fazem aqui o que a maioria dos pais diante de um filho “diferente” faz. Mesmo com
boas intenções, muitos preferem isolar a criança ao invés de auxiliá-la com
seus dons.
Essa atitude fez
com que Elza reprimisse quem ela é realmente, o que a tornou mais perigosa
ainda, pois seu poder não está sob controle.
Quando os pais
das meninas morrem, Elza por ser a mais velha deve assumir como o trono como
rainha.
Nesse instante a
moça que esteve trancafiada tem de sair e enfrentar seus temores.
A morte dos pais
mostra um aspecto simbólico importante para o desenvolvimento da psique. Enquanto
as leis e normas impostas pela família e sociedade não morrerem dentro de nós, não
é possível atender o chamado da própria alma.
Elza então de vê
diante de seus poderes incontroláveis e o medo toma conta de seu ser. Diante disso,
ela foge para as montanhas e ganha a liberdade. Entretanto ela não está livre,
pois ainda não tem controle sobre seus poderes.
A verdadeira
liberdade só ocorre quando assumimos a responsabilidade por nós mesmos, pelos
nossos dons e defeitos.
É claro que a
solidão nos auxilia a confrontar nossos medos e a entrar em contato com nosso
eu mais profundo. Todavia, no processo de individuação devemos nos tornar nós
mesmos, mas sem se isolar do mundo. O individuo deve colocar seus dons
individuais a serviço do coletivo.
E nesse instante
surge Anna se intrometendo e perturbando a aparente paz da irmã. Ela é seu
aspecto sombrio, extrovertido, que a chama para a responsabilidade e que a tira
do seu papel de vitima.
A vítima sempre
possui dentro de si o algoz. Enquanto Elza se coloca como vitima perseguida,
seu algoz interno acaba machucando aqueles que ama.
Elza além de
introvertida se assemelha as deusas virgens da Mitologia Grega. Por virgem se
entende que a deusa era completa em si mesma e não busca relacionamentos
amorosos para se completar. São elas: Atena, Ártemis e Héstia.
Por ser
introvertida, podemos aproximar Elza de Héstia, o que é muito interessante,
pois Héstia é uma deusa do fogo, da lareira e do lar.
Mas como uma
princesa que produz gelo pode se assemelhar de uma deusa do fogo?
Bem somente pelo
fogo provocado pelo amor incondicional pela sua irmã que Elza aprende a
controlar seus poderes. É indo para o oposto que ela encontra o equilíbrio. Entrando
em contato com sua Héstia interior, ou seja, seu fogo, seu calor, que ela
consegue derreter o gelo em que seus sentimentos se encontravam.
Mas a característica
mais marcante nesse filme e que o diferencia dos demais contos de fadas com heroínas,
é que a redenção de Elza e Anna ocorre quando ambas demonstram amor verdadeiro
uma pela outra.
Em nossa
sociedade infelizmente existe um estereótipo de que as mulheres não são
companheiras. A metáfora de Frozen não serve apenas para irmãs de sangue, mas
também para irmãs de coração. Anna é traída pelo seu primeiro amor e Elza é
julgada pela sociedade por ser diferente e poderosa. Seus próprios pais foram
incapazes de ajudá-la a lidar com seus dons e a incentivaram a ser normal e
adaptada a uma sociedade preconceituosa. Sua irmã é a única que não a julga e
não a teme e devido esse amor e aceitação plena da forma de ser uma da outra
que ocorre a salvação delas e do reino.
Bibliografia:
BOLEN, J. S. - As
Deusas e a Mulher, São Paulo: Paulus, 1990
JUNG, C. G.
Tipos Psicológicos 8. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
SILVEIRA, N.
Jung: Vida e Obra. 7 ed. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 1981.
Comentários
Postar um comentário