O Retrato de Dorian Grey



Por: Hellen Reis Mourão
  
O romance de Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Gray, retrata a história fictícia de um homem jovem chamado Dorian Gray, que vivia na Inglaterra aristocrática e hedonista do século XIX, e devido a sua beleza física, se tornou modelo para uma pintura do artista Basil Hallward.
Lord Henry Wotton, um aristocrata cínico e hedonista típico da época e grande amigo de Basil, conhece Dorian e o seduz para sua visão de mundo, onde o único propósito que vale a pena ser perseguido é o da beleza e do prazer. Eis um trecho:
Ah! Tome plena consciência da sua juventude enquanto a possuir. Não esbanje o ouro dos seus dias a dar ouvidos a gente maçadora que tenta aproveitar o fracasso irremediável, nem perca o seu tempo com os ignorantes, os medíocres e os boçais. São esses os objectivos doentios, os falsos ideais dos nossos dias. Viva a vida maravilhosa que existe em si! Não desperdice nenhuma oportunidade, procure sempre novas sensações. Não tenha medo de nada...”.
Dorian, então, fica seduzido pelas palavras de Henry, mas também, pela tristeza de seu destino, que era envelhecer.
Seu retrato finalmente fica pronto, mas ao vê-lo, Dorian exaspera-se e exprime o desejo de que o quadro pudesse envelhecer e ele continuar eternamente com seu rosto e corpo jovens. Eis um trecho:
"Que tristeza! Vou ficar velho, e horrível, e medonho. Mas este retrato permanecerá eternamente jovem. Precisamente como neste dia de Junho. Se pudesse dar-se o inverso! Ser eu eternamente jovem e o retrato envelhecer! Daria tudo para que isso acontecesse! Tudo o que há no mundo! Daria a própria alma!!”
E é o que realmente ocorre. Enquanto o retrato definha, revelando a decadência que é o seu interior, seu rosto continua com os traços angelicais dos seus 18 anos. No entanto, com as influências de Lorde Henry, Dorian se torna egoísta, devasso e mau, até encontrar um final trágico.

Em uma análise psicológica observa-se que Dorian é um rapaz cujo ego está extremamente identificado com a sua persona. A persona de uma jovem belo, viril e hedonista. Onde a busca pela juventude eterna o torna um escravo de sua própria imagem em detrimento de sua alma e de sua humanidade.
Conforme Jung em seu livro O eu e o Inconsciente:
“Todos os conteúdos que não se ajustam a esse todo são negligenciados, esquecidos, ou então reprimidos e negados. Isto constitui uma forma de autoeducação que não deixa de ser, porém, demasiado arbitrária e violenta.
Em benefício de uma imagem ideal, à qual o indivíduo aspira moldar-se, sacrifica-se muito de sua humanidade.”
Vemos no romance que quanto mais o ego se identifica com a persona, maior é a rejeição de partes de si que não são aceitas. Essas partes são a decrepitude, o envelhecimento e a morte.
Nossa sociedade não sabe lidar com o fim. A velhice não é bem aceita (é só observar a forma como tratamos nossos idosos!) e a morte, por incrível que pareça, ainda é um tabu.
Portanto Dorian Gray não é uma figura distante de nós.
A mídia nos bombardeia a todo instante com imagens de corpos esculturais e rostos jovens. Cada vez mais se busca cirurgias plásticas e outros tipos de tratamentos invasivos em nome de algo impossível.
Assim como Dorian, estamos extremamente identificados com a figura do puer.
O puer segundo Marie-Louise Von Franz, no livro Puer Aeternus, “juventude eterna”:
“Em geral, o homem que se identifica com o arquétipo do puer aeternus permanece durante muito tempo como adolescente, isto é, todas aquelas características que são normais em um jovem de dezessete ou dezoito anos continuam na vida adulta, juntamente com uma grande dependência da mãe, na maioria dos casos.”
Não há nada de errado no cuidado com o corpo e na busca de uma boa aparência. Um pouco de vaidade é necessário e não dever ser reprimida, desde que se tenha em mente que a beleza e a juventude são efêmeros e que a decrepitude do corpo é inevitável. Nesse momento, então, deve entrar em cena um novo arquétipo, o da sabedoria!

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