A bruxa e a sedução
Por: Hellen Reis Mourão
Nessa nova safra
de produções de filmes e séries com a temática de contos de fadas, uma questão
interessante se apresenta na forma de uma figura: A figura da bruxa!
Em todas as
produções recentes, a bruxa, ou madrasta é sempre mais sedutora, mais
interessante ou até mesmo mais bonita que a princesa.
E se observarmos
os contos de fadas mais famosos, como Cinderela, Branca de Neve, Bela
Adormecida, Rapunzel, a figura da bruxa está sempre presente. É uma figura que
aparece repetidamente apenas mudando a roupagem.
Mas porque as
bruxas seduzem tanto? Porque elas atraem tanto o nosso imaginário?
Para entendermos
essa questão é importante atentarmos que se trata de um arquétipo. A bruxa/madrasta
representa uma faceta do arquétipo da Grande Mãe.
No arquétipo da
Grande Mãe estão inseridas a bruxa ou madrasta (a mãe diabólica, terrível), a
velha sábia e a deusa que representa a fertilidade (aspectos da mãe boa).
A imagem da boa mãe
representa tudo o que é belo e puro, já a mãe terrível representa aquilo que é
ligado à destrutividade, à bruxaria e à animalidade.
Segundo Newman,
em A Criança, o aspecto da Mãe Terrível liga-se à morte, ruína, aridez, penúria
e esterilidade.
Infelizmente,
com a cristianização de nossa sociedade, o aspecto diabólico da bruxa foi reprimido
da imagem da Grande Mãe. Sua imagem se tornou unilateral, sendo a maior
representante dessa imagem a Virgem Maria.
De acordo com
Marie Louise Von-Franz, em A sombra e o mal nos contos de fadas, a bruxa é a Deusa-Mãe
negligenciada, a Deusa da terra, a Deusa-Mãe em seu aspecto destrutivo.
Nisso percebe-se
que todo o aspecto ctônico, toda sedução e sexualidade femininas foram suprimidas
e associadas à imagem da bruxa, da feiticeira.
Entretanto, é um
aspecto extremamente necessário para o desenvolvimento psicológico e para o
processo de individuação.
Nos contos de
fada citados, geralmente o pai (elemento masculino) é fraco ou inexistente,
sendo somente redimido, após o enfrentamento da heroína com a bruxa, possibilitando
a chegada do príncipe. E a mãe boa morre, dando lugar a bruxa ou madrasta, que
passa a persegui-la e humilhá-la.
Entretanto, a
bruxa é extremamente importante para o desenvolvimento da princesa. Sem ela não
há narrativa, não há estória. Sem ela a princesa não sairia do lugar. Ela é uma
força motriz que força a individuação.
Portanto, é a
sombra da boa mãe negligenciada, que torna a heroína ou princesa tridimensional.
Em termos
individuais a mãe terrível nos força a sair da zona de conforto. O ser humano
sempre busca o prazer e o aconchego doa braços da boa mãe, e ele sempre tende a
se tornar inerte nesse estado paradisíaco. Entretanto nele, não há
desenvolvimento. Sem a mãe terrível para nos expulsar do paraíso não progrediríamos.
Ao aceitar o
desconforto, o sofrimento e as limitações impostas pela bruxa, podemos nos
desenvolver em direção a uma totalidade, capaz de integrar o bom e o ruim, o
agradável e o desagradável.
Portanto, sem
ela não podemos conhecer os opostos.
Além disso, a
bruxa possui um caráter numinoso e por isso ela é fascinante. Ela é aterradora,
pois pode manter a consciência em cativeiro, mas extremamente atraente.
Não é a toa que
as produções de contos de fada hoje dão ênfase a esse personagem. Sua força
enquanto mobilizadora do desenvolvimento é tremenda. Nossa consciência coletiva
clama pela totalidade para que possamos dar um avanço em nosso processo de
individuação e em nosso desenvolvimento coletivo.
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